A influência da literatura de Tolkien na música - Especial Blind Guardian (10)


Já que falamos tanto do Blind Guardian em uma seqüência de 10 postagens específicas sobre eles, nada mais justo que resenhar o último trabalho dos bardos.
Ainda que tivessem fugido (só um pouco) da temática – alguns discos não tiveram nada relacionado diretamente com J. R. R. Tolkien –, os bardos são, ainda, os maiores fãs do autor. Isso porque eles não abandonaram em nenhum momento de sua trajetória temas como fantasia e ficção científica que só são o que são na contemporaneidade, graças às contribuições do autor inglês.

O décimo primeiro disco do Blind Guardian, Legacy of the Dark Lands, foi lançado em novembro do ano passado. Se caso o estilo convencional da banda for algo que te afasta de conhecer o novo trabalho dos caras, sugiro dar uma chance ao Legacy... Ele não soa muito bem como aquele Blind Guardian calcado no power metal que conhecemos, embora também não soe progressista como foi no A Night At The Opera (2002) e que afastou aqueles que preferiam a base inicial.
O novo álbum do grupo mostra a "mudança" logo de cara, na capa, mas uma mudança sonora. Se você é daqueles "tenho relutância ao novo" por favor, reveja seus conceitos. Ali, na capa mesmo, o disco traz no topo escrito não só o nome da banda, mas outros termos: Blind Guardian Twilight Orchestra. 
Deu para sacar o que estava proposto?



Sim, temos aqui uma obra com música clássica. Legacy começou a sair do papel em 2017 e mostra os alemães sendo acompanhados pela Orquestra Filarmônica de Praga. O conceito das letras é como se tivessem criando a trilha sonora para uma saga: o livro Die Dunklen Lande (As Terras Escuras), escrito por Markus Heitz - uma das novas forças da literatura fantástica contemporânea - foi a escolha da vez.
A sinopse da história de Markus é altamente atrativa, e conta uma história de um mercenário com poderes mágicos e sombrios.


1629. A Guerra dos Trinta Anos com seus conflitos sacode a Europa e se enfurece particularmente sem piedade na Alemanha.
A jovem aventureira Aenlin Kane viaja para a cidade neutra de Hamburgo para explorar o legado de seu famoso pai, Solomon Kane. Juntamente com sua amiga Tahmina, uma mística persa, ela entra no tumulto da guerra. Eles aceitam uma ordem séria da empresa das Índias Ocidentais: uma tropa é reunida para seguir as linhas para o sul da Alemanha, Bamberg, onde os mais cruéis julgamentos de bruxas queimam a estaca - mas há muitas coisas diferentes.
Aenlin e Tahmina conhecem o mal e os demônios que vagam pela terra e usam a turbulência da guerra a seu favor. Em breve, haverá mais de um pedido da empresa.
E o líder do grupo, Nicolas, tem um segredo sombrio...

Fato curioso: algumas bandas de power metal que se embrenham nas temáticas fantasiosas, às vezes, apresentam duas tendências, quando buscam experimentar coisas novas: ou se atrelam ao estilo progressivo, ou se alinham ao uso e abuso de orquestras.

Quem acompanha a carreira do Blind Guardian sabe que os seus membros sempre tiveram o desejo de gravarem um álbum acompanhados por uma orquestra. Com Legacy of the Dark Lands eles tiraram o projeto do papel e colocaram na prática.  O processo demorou mais de vinte anos para ser finalmente ser realizado e teve a sua origem ainda na década de 1990, quando começaram suas carreiras. A primeira faísca que isso estava por vir cedo ou tarde foi quando engatilharam em 1998, o Nightfall in Middle-Earth, embora este ainda fosse bastante power metal.


No décimo primeiro álbum do Blind Guardian não encontramos instrumentação com guitarras, teclados, baixo e bateria, mas sim, com orquestra, mais Hansi Kürsch cantando e sendo amparado por corais. É aí que está a mudança que, a meu ver é um salto importante na carreira deles, uma vez que todos os músicos precisam se arriscar sempre que sentirem vontade, para se reinventarem.

Há quem possa dizer que isso tudo não agrada uma parcela dos seus fãs. Isso é inevitável para qualquer banda. Eu acho que aqueles que gostam das músicas do Blind Guardian, sem terem torcido o nariz para a fase progressista podem gostar dessa vertente "sinfônica" que apresentam no recente álbum. 
Legacy of the Dark Lands pode não ser fácil para quem tem o foco de ouvir as novidades metálicas que estão disponíveis no mercado. Nem de longe deve ser ouvido como entretenimento, passatempo. É um álbum longo e complexo que requer um tanto bom de boa vontade e atenção. Possui ao todo 24 faixas e pouco mais de 75 minutos. No entanto, ele me pareceu uma resposta a uma situação de reprovação que os músicos passaram, um tempo atrás.

Diante da expectativa da adaptação do O Senhor dos Anéis - principal obra de Tolkien - aos cinemas dirigido por Peter Jackson, os bardos não se demoraram em se oferecerem para trabalhar com a trilha sonora dos filmes que seriam divididos em 3 partes. Conta-se que eles teriam enviado algumas músicas para o diretor que negou a oferta, dizendo que eram bons músicos, mas que ele queria e imaginava que uma trilha orquestrada fosse ideal para os longas. A atmosfera de guitarras em distorções não parecia casar com o que o diretor buscava e ele não poderia ser condenado por isso. Em se tratando de cinema, algumas coisas são muito tradicionais e as trilhas originais mais poderosas e que fazem parte de nosso imaginário cultural são todas, orquestradas. Até aquele momento, o Blind Guardian ainda não tinha feito nada (em termos sonoros) que fosse do jeito que o diretor esperava.

Desejosos de terem feito uma trilha sonora completa para uma história que tanto gostavam, a premissa inicial tinha sido contemplado com Nightfall in Middle-Earth (1998). A questão da orquestra pode ter ficado na cabeça dos músicos, em especial o letrista Hansi, mas não foi colocada (ainda) em prática. Com Legacy of the Dark Lands, percebemos que se Jackson tivesse dado crédito à eles, orientando que não fossem tão criteriosos com o power metal e que tentassem um trabalho orquestrado, teriam, muito possivelmente, sido bem sucedidos. Com Legacy, se mostraram capazes de alcançar esse feito embora, tenha se concretizado 21 anos depois do Nightfall e do início das gravações do primeiro filme O Senhor dos Anéis (a primeira parte A Sociedade do Anel chegaria aos cinemas estrangeiros só no fim de 2001). A
As semelhanças entre esses dois álbuns mencionados do Blind Guardian é fácil de analisar: enquanto no primeiro, as letras falam sobre as histórias de O Slimarillion de Tolkien, o segundo é sobre o livro Die Dunklen Lande d autor alemão, Heitz.
Contando ainda com diversas narrações entre as músicas, que vão apresentando a história e os personagens - e cujos narradores, são os mesmos de Nightfall in Middle-Earth -, o disco funciona como uma peça única, assim como o antecessor de 1998.

Ainda assim, Legacy of the Dark Lands é um trabalho épico, profundo que não se compara com qualquer outro que o Blind Guardian tenha feito até então. No cenário do metal, o álbum acaba sendo, sobretudo, corajoso por apostar numa sonoridade que não é aquela que os identificam entre seus pares. 
O resultado é primoroso e bonito. Sugiro que ouçam! Podem se surpreender positivamente.

Fiquem com a faixa War Feeds War e com ela, fechamos as postagens especiais sobre o Blind Guardian!

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