Bob Dylan, 79 - Um dos maiores de todos os tempos (texto 2)

Em 1965 havia um grupo denominado “folkies” que eram ligados a organizações que protestavam em favor dos direitos civis, contra o racismo, o machismo e – principalmente – em favor das liberdades individuais.
Sua trilha sonora era a música folk (daí sua denominação) e tinham em Joan Baez, Arlo e Woody Guthrie seus ídolos musicais.
E a então nascente estrela Bob Dylan era a esperança de que continuidade do movimento fosse garantida.
Em suas letras, Dylan versava sobre coisas caras aos folkies e suas músicas, assim como a de Joan e Woody, eram embaladas apenas por instrumentos acústicos para valorizar as palavras e deixar a mensagem inteligível para o maior número de pessoas possível.
O sucesso radiofônico de Dylan o transformou em um semideus para este público, seus discos vendiam muito e a reputação politizada ajudavam a difundir a cena folk, seu estilo e seus protestos.
Em 1959 numa ação genial, o cantor Peter Seeger e o futuro empresário de Dylan, Albert Grossman, junto a algumas outras pessoas, criaram um festival de música folk para – além de difundir seu movimento - promover os artistas do gênero.
Nascia então o festival de folk de Newport, palco onde Bob ouviria em 1964 a seguinte apresentação feita por Seeger.
“-Ele está aqui, vocês o conhecem, recebam-no, ele pertence a vocês... Bob Dylan!”
Aquilo incomodou o cantor de um modo tão agudo que ao voltar ao trabalho alguns dias depois, sentiu necessidade de mudanças.
“-Eu não pertencia a ninguém senão a mim mesmo...” – disse.

Dylan então trocou os temas de suas músicas por viagens pessoais, visões introspectivas de assuntos variados tais como dores de abandonos e o hedonismo sexual próprio da geração de escritores beat como Jack Kerouac e William Burroughs.
Mas, para os folkies, pecado maior foi convocar uma banda para vestir as letras com rock and roll pesado (para 65 aquilo era o mesmo que heavy metal) com generosas pinceladas de blues e psicodelia.

Em 1965 ele lança Bringing It All Back Home com guitarras raivosas que tomam conta de mais de metade do disco, ficando para o lado B algumas poucas canções acústicas ainda com roupagem folk. Entre elas o clássico “Mr. Tamborine Man”.
E é a bordo deste disco que em 1965, Dylan sobe ao palco do festival de folk de Newport como headliner, mas ao tocar “Maggie´s Farm” ouve as vaias – que já não eram poucas – se tornando ainda mais selvagens.
“-Judas!” – se ouviu vindo da plateia.
“-Você é um mentiroso!” – retrucou Dylan antes de retirar do palco.

Curiosamente, aquele público que brigava com todas as armas e por vezes com alguma violência para exigir respeito às liberdades individuais, negava à Bob Dylan exatamente isto.
Dylan não poderia ter a liberdade pessoal de pensar e produzir sua arte da forma que melhor lhe parecesse.
Teria que pensar e agir exatamente como queriam seus fãs, que usaram a desculpa de que só vaiaram aquele tipo de música porque amavam Dylan e queriam protegê-lo.

Uma semana depois das vaias em Newport, Dylan voltou ao estúdio e gravou “Positively 4th Street”, com roupagem folk e melodia doce, mas com uma letra de escárnio que estapeava os folkies de maneira espetacularmente forte e dava sua resposta na forma de versos violentos como os que encerravam a canção:
“I wish that for just one time
You could stand inside my shoes
And just for that one moment
I could be you
Yes, I wish that for just one time
You could stand inside my shoes
You'd know what a drag it is
To see you”
(Queria que uma só vez você pudesse estar no meu lugar e que só por esse momento eu pudesse ser você. Sim, eu queria isso só uma vez. Que você pudesse estar em meu lugar e assim você saberia o quão desagradável é ver você.)

Não se teve mais notícias de vaias ou rejeições por parte dos fãs de Dylan após este episódio.
O que mostra que o recado foi entendido, assimilado e o recibo devidamente passado.
O inquieto Bob Dylan ainda guinaria seu som rumo ao country, ao gospel e a diversas direções diferentes em sua carreira, afinal, ele era livre e só pertencia a si mesmo.

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