Resenha: "We Are Chaos" - Caos até na interpretação (por Adão Alves)

Muitos dizem que a "era de ouro" de Manson terminou em *Holy Wood*. Independente disso, sabemos que o que veio a seguir foram trabalhos que fugiram um pouco daquele viés que o lançou como um mega artista, porém tão bons quanto. Ouvimos o maravilhoso "Eat me, Drink me", "Pale Emperor" e "Heaven Upside Down". Confesso que tentei ver o outro lado de "We Are Chaos" como um disco artístico e ousado. Talvez seja, porém não convenceu tanto a crítica. 

Antes de tudo, vale mencionar que não sou um daqueles fãs que se prendem ao passado e pede que mais do mesmo seja lançado. Como artista sei da necessidade que sentimos em sempre criar algo novo. Algo diferente de tudo o que já fizemos. Queremos inovar, tentar novos meios de nos preencher. Nem sempre conseguimos. Outras vezes ficamos felizes com o resultado, porém nao agradamos o público. Existem ainda os dias em que a obrigação de produzir faz com que a paixão em criar acabe. Enfim, não estou aqui para dizer que o disco é ruim, preguiçoso ou mal feito como vários tem dito em suas resenhas. 

Primeiramente temos que pensar o que somos, o que fazemos e para o que fazemos. Temos condições de fazer algo melhor do que outro? Se não, de que adianta jogar mil pedras em um trabalho e dizer o que deveria ou não ser feito? Temos que, no mínimo, imaginar que a criação de todo e qualquer trabalho artístico envolve várias questões complexas demais para resumirmos em um simples comentário. Arte vai muito além de uma opinião feita por alguém que sequer se arriscou em uma dada carreira. 

Arte envolve sentimento, envolvimento, paz, amor, tempo, paciência, sensibilidade e tantas outras questões para, somente no fim, pensarmos em técnica. Quantos foram os artistas virtuosos que já conheci que não eram nada além de seres cheios de técnicas mas rasos demais para atingir alguma profundidade artística. Arte vai muito além da técnica e conceitos engessados que muitos se agarram. 

E é em virtude de tudo que citei minha consideração por observar todo e qualquer material artístico de forma consciente. E é aqui que entramos em "We are Chaos". 

Este disco não possui a grandeza dos demais, ainda assim é um disco que você escuta e o reconhece como uma obra do Marilyn Manson. Há tanto para se observar que o argumento sobre a fragilidade do disco não cola. A melancolia e os vocais característicos estão presentes. Em várias músicas percebemos versos em que ele se questiona quem e o que ele é ao passo que o disco já responde, no título, que somos caos. Tantos detalhes e versos que nos mostram muito da visão de Manson sobre o cenário atual que é simplório dizer, apenas, "não gostei, então é ruim". 

A faixa título, tanto no que se refere ao vídeo quanto ao lírico, tem suas deficiências. Confesso que seria a faixa "menos Marilyn Manson" que pude perceber no disco. Independente disso, se olharmos com um viés diferente percebemos alguma ousadia e uma mensagem que se completa com as demais canções. 

Temos canções como "Solve Coagula" e "Broken Needle" que, apesar de serem trabalhos com a característica do artista, apresentam uma sonoridade um tanto quanto ousada com riffs agradáveis e concisos. Esta última "invoca" todo o espírito e melancolia que ele sempre trás em tudo que se dispõe a criar. 

"Perfume" é uma das poucas faixas que vejo, como consenso, que a maioria gosta. Curiosamente é a faixa que mais trouxe elementos do antigo Manson. Tanto a introdução quanto letras e riffs. E, se for pra desejar músicas como as de antigamente, porque não falar sobre "Red, Black and Blue"? 

Tenho a sensação de que todas essas resenhas ruins sobre o disco refletem a necessidade de ter mais do mesmo e ou comparar um disco desejando que seja tão grande e ou maior do que outro já consolidado no mercado. Não estou aqui para dizer que todos estão errados. É questão de gosto. Mas, em tantas canções ousadas, onde estavam eles quando ouviram "Don't Chase The Dead" e "Paint You With My Love"? 

"We are Chaos" é uma obra que possui a assinatura de Marilyn Manson. Evidentemente não é como os outros discos e isso é muito bom. Manson não é um artista que vive em sua própria sombra "fazendo covers de si mesmo". O disco não é uma obra que agrada na primeira audição, porém se avaliar todo o contexto é um bom disco. Gostar mais de outro álbum não invalida o trabalho que foi feito, não o torna ruim ou frágil. A fragilidade está, em geral, no argumento ou na pressa de ouvir algo de forma rasa. É justamente aí que está o "pulo do gato" deste disco. Percebam ou não... 

* Adão Alves é tatuador profissional e também escritor. Atualmente ele trabalga no estúdio Banshee localizado em Uberlândia-MG (perfil no Instagram aqui)

Comentários