Musique-se Recomenda: Vendavais - o retorno triunfante do Ave Sangria

 Ok, demorou-se a falar deste lançamento aqui, afinal, o disco foi lançado em 2019, mas em nossa defesa (na do Ron Groo, pra ser exato...) os caras demoraram muito mais para lançar esta perola do rock psicodélico brasileiro.
Então, para que as coisas fiquem mais corretas, ao invés de lançamento, Vendavais, segundo e mais recente álbum da lendária banda pernambucana Ave Sangria vai ser tratado já sob o selo de clássico, porque, convenhamos, já nasceu assim.


O primeiro disco, que levava apenas o nome da banda, foi lançado em 1974 e hoje é cultuado por todo mundo que importa dentro do ultra misturado universo da moderna música popular brasileira.
Também não é para menos.
O disco era lírico, pesado, psicodélico, provocador e a banda tinha entre suas fileiras dois músicos geniais que depois fariam sucesso como parceiros constantes de Alceu Valença: o guitarrista Paulo Rafael e flautista Zé da Flauta.
Mas não eram apenas os dois que eram geniais.
Também formavam a banda o baixista Almir Oliveira; o guitarrista Ivson Vanderley, o Ivinho; Agrício Noya, percussionista (ambos falecidos em 2015) e o baterista Israel Semente, que faleceu em 1990 e o cantor Marco Polo.
Agora, em sua atual encarnação, o Ave Sangria conta – além de Paulo, Zé da Flauta, Almir, hoje deslocado para outra guitarra e violão, e Marco Polo - Junior do Jarro na bateria, Gilú Amaral na Percussão e o baixista e produtor Juliano Holanda.
A gravação deste disco ainda contou com a participação especial de Carlos Trilha nos sintetizadores.


Exatos 45 anos depois do debut, surge este Vendavais que como o próprio nome já sugere, sopra com força todas as melhores qualidades da banda mesclando a linguagem psicodélica com o melhor da música e cultura nordestina embalada em rocks, baladas com uma sonoridade contemporânea e empolgante com um som cristalino que impressiona desde a faixa de abertura “O Poeta” com sua crítica social implacável e poderosa até a instrumental bluseira “Em Órbita” que fecha o disco.
As guitarras tem o peso e a agressividade que junto com as levadas ágeis da bateria fazem a gente pensar que se trata de uma banda de jovens e não de respeitáveis senhores já entrados na sexta década de vida.

Os grandes destaques do disco vão para a trinca de inicial com “O Poeta” ("O poeta suicidou-se de repente. Deu um teco na ideia e já estava demente quando anunciou: Não te iludas mais, criança antes que tenhas tempo pra correr já estarás na pança de um aparelho de TV"). 

A levada contagiante de “Silencio Segredo” cantada por Almir Oliveira e a faixa título que traz um riff inspiradíssimo de guitarra sobre uma melodia que só a música nordestina (mais especificamente a pernambucana) pode produzir. A letra tem partes faladas, mas não dá para dizer que é rap, sinto.

Mas não se engane, o disco não termina aí e nem fica repetitivo.
A levada acústica de “Marginal”, o peso melódico de “Dia a Dia” que clama pela igualdade entre homens e mulheres e “Olho da Noite” com a introdução fantástica dos repentistas tradicionais ao universo psicodélico. Como se Caju e Castanha, por exemplo, tocassem encharcados de LSD.
Ainda sobra tempo para o erotismo sensualíssimo de “Caricias” e “Sundae” fazer a parte romântica do álbum.

Vendavais produzido por Paulo Rafael e Juliano Holanda e foi lançado nas plataformas digitais e em CD (encontrável AQUI no próprio site da banda)
Também chegou a ganhar versão em LP, mas hoje em dia achar este item é complicado e - principalmente – caro, mas vale o esforço (e o empobrecimento).

O correto é ouvir de cabo a rabo prestando atenção aos detalhes que aparecem a cada audição, mas aí corre-se o risco de tal qual a cobra que está sempre atrás da própria calda, cair num ciclo vicioso e não conseguir mais parar de dar o play no álbum.
Viu? Já nasceu clássico.


Comentários