Caetano Veloso: 80 anos - ou - Como não decifrei a esfinge e ela me devorou (por Ron Groo)

Contar ou explicar Caetano Veloso não é tarefa para qualquer um.
São tantas faces, tantos estilos, tantas fases que para um preguiçoso como eu, melhor é chamar de “som do Caetano”.
O próprio se enrolou um pouco ao tentar se contar ao lançar seu livro de memórias, Verdade Tropical (1997/Companhia das Letras), um calhamaço que não se configura em um pecado em sua trajetória, mas também não é de seus momentos mais brilhantes. Particularmente, achei o livro enfadonho.
Recentemente, Luiz Felipe Carneiro e Tito Guedes fizeram essa tour de force ao lançar Lado C – A trajetória musical de Caetano Veloso até a reinvenção com a banda C (Máquina de Livros/2022) e ao que consta, se deram muito bem na tarefa.
Então, para quem quiser entender (ou tentar) essa verdadeira esfinge da música popular brasileira, fica a dica.


Aqui o que vai ser contado é de como o artista entrou na vida deste que está escrevendo.
E não... Não foi através de minissérie alguma, muito menos por música de novela ou declaração polemica do artista à imprensa.  Que são muitas e muitas...
Mas pela vingança. Vai entender.
Quando se é adolescente, o mundo é bem olho por olho, cd por cd.
E foi neste espirito que entrei em uma lojinha de canto de rua para reclamar de um disquinho defeituoso que havia comprado lá no dia anterior.
O ano era 1992 e o disco era uma cópia (bem vagabunda, possivelmente pirata) de um álbum do Black Sabbath (Sabbath Bloody Sabbath) que até tinha vindo lacrado, mas sem encarte (ou informação alguma) e ainda por cima com a faixa de abertura pulando um monte.
O vendedor, aparentemente contrariado por ter sido descoberto na safadeza, além de atender muito mal, ainda me deixou esperando por eternos vinte minutos para trazer a notícia de que não tinha outra cópia daquele disco pra me dar.
Ofereceu outro título (Paranoid) e eu aceitei.
Pra maior irritação, disse que tinha que ir buscar em outra loja (ou queimar o CD nos fundos daquela.)
Foram mais vinte minutos esperando e pensando, entre outras coisas, que estava sendo feito de bobo.
Algo precisava ser feito e pensei logo em dar algum prejuízo ao cara.
“-Vou levar um cd sem pagar”. – Decidi.
À minha frente, uma estante com vários títulos de MPB que, segundo a minha lógica à época (não sei porque) era algo que devia vender muito e dar lucro à loja.
Estiquei o braço e puxei alguns e junto, veio um de capa branca com a estilização de uma borboleta que me chamou a atenção: “-Vai ser este.”


E assim Bicho, disco de 1977 de Caetano Veloso entrou para minha mochila e coleção de discos.
E para o rol de minhas paixões musicais destruindo qualquer resquício de preconceito que eu ainda tinha com música brasileira que não fosse rock.
Foi só o primeiro... Depois fui comprando (e não mais roubando) outros títulos. Quase todos os autorais na verdade. E todos são maravilhosos.
Ah! E o Paranoid que o cara trouxe? Sim, era original, abri pra conferir, mas não coloquei pra tocar e acabei dando de presente sem sequer ouvir já que o disco do Caetano ficou no cd player quase que em tempo integral por meses.
Já Caetano, não parei de ouvir nunca mais.

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