No começo da década de 2010 a música no Brasil passava
por um período de transição de formatos.
O vinil, que hoje vem ganhando força e voltando (ainda
que a preços proibitivos) estava fora da jogada. Apenas os colecionadores e
saudosistas iam atrás das bolachonas antigas e poucos artistas faziam edições
de seus novos trabalhos nesta mídia.
O cd, que havia enterrado o vinil e era o formato mais popular de venda de
música ao consumidor já começava a perder força.
Se era um formato - até então barato – de se fabricar, também era fácil de se piratear.
Qualquer um com um PC em casa copiaria com alguma qualidade os disquinhos e
venderia por um terço do preço do original. Some-se isso à popularização dos
formatos digitais (mp3, wave, etc) e o cenário começava a ficar meio sombrio
para as gravadoras. Fabricar e vender cd´s já não era assim um negócio tão
rentável.
Com isso, os artistas independentes e/ou iniciantes ficaram ainda menos
atrativos para as gravadoras e tiveram que se virar.
Por sorte, também chegavam sites como MySpace e Bandcamp e até mesmo o youtube
para hospedar estes trabalhos musicais, porém, ainda era tudo novo e nem todos dominavam
a linguagem.
Também não havia algoritmos que sugerissem novos nomes para quem pesquisasse
sons semelhantes aos que os artistas hospedavam em suas páginas.
Trabalhos que não caiam em uma rede de divulgação (quase que boca a boca) mais
forte, ficavam limitados aos círculos de amigos ou eram esquecidos mesmo.
Isso só foi melhorar com a chegada das plataformas de streaming com seus
algoritmos que de certa forma “facilitaram” a divulgação de músicas e, por uma
assinatura mensal de poucos reais, era possível ter acesso à catálogos inteiros
de forma rápida e muito mais segura do que garimpar a internet atrás dos
arquivos de áudio. Era a música, literalmente, à um clic do ouvinte.
Nestas transições todas, bandas grandes, artistas
consagrados não tiveram problemas e suas obras foram todas (ou em grande parte)
transpostas para as novas tecnologias.
Artistas menores ou independentes, com muito custo, migraram aos poucos e
tiveram sua vida facilitada com os streamings.
Mas no caminho muita coisa boa se perdeu, ficou esquecida
ou isolada em pequenos grupos.
foto: Mauro Figa |
É aqui que entra Siso, cantor, compositor e produtor
atuante na cena indie brasileira que viu e participou de tudo isso tocando com as
bandas Spooler e As Horas ou colaborando com nomes importantes como Letrux, a
banda Carne Doce os Cabezas Flutuantes e está lançando Vestígios, seu terceiro
álbum solo. (ouça Vestigios em sua plataforma preferida clicando aqui)
Vestígios é mais que um disco, é uma ferramenta de
resgate para canções e nomes que quase se perderam nas transições de formatos.
A escolha levou em conta nomes com quem Siso já havia trabalhado, tocado ou
gravado ao longo de sua trajetória.
O disco tem oito faixas que ganharam da mão personalíssima do músico em uma bela polida extraindo ainda mais da força e beleza que já tinham.
Assim, faixas como “Homem Pássaro” da banda mineira Paralaxe se torna ainda mais explosiva, enquanto “Lanny” da banda globalizada Os Amantes Invisíveis (tinha integrantes gregos, mineiros e foi formada em Londres) ganha um peso delicado ilustrando a bonita letra que homenageia o guitarrista Lanny Gordin e tem um refrão emocionante. (“Londres tem ouro / Xangai deu a vida / Dresden conta corpos / Ainda conta corpos”).
Uma das melhores do disco, “Mercado de Lutas” originalmente da banda paulista Nã, ganha um groove altamente dançante cortesia da percussão eletrônica e do baixo que carrega a canção.
A guitarra é o instrumento principal da releitura de “Isso Tudo é Como um Rap” dos capixabas da Sol Na Garganta do Futuro e “Nada Além” da festejada banda acreana Los Porongas navega tranquilamente nas águas do synthpop.
Completam o disco a experimental “Jovem Tirano Príncipe Besta” de Negro Leo e a bonita “Cor de Jasmim” dos mineiros da Umrio, à qual coube abrir o disco e é co produzida por João Victor Santana, guitarrista da banda Carne Doce e tem a bateria tocada por Gabriel Bruce.
Outros nomes que fizeram parte da produção e tocaram no disco são Patrick Laplan, que entre outros já trabalhou com os Los Hermanos (baixo, bateria, synth, piano elétrico e programações em “Nada Além”); Carina Renó (guitarras, synth e programações em “Lanny”) e PFink (programações e synth em “Homem Pássaro”), Christopher Mathi (synth, guitarra, programações e efeitos em “Mercado de Lutas”)
Enfim, Vestígios além de mostrar toda a versatilidade de Siso, joga luz sobre nomes que mereceriam ter mais penetração junto ao grande público resgatando canções brilhantes, muitas das quais, nem estão presentes nas atuais plataformas digitais.
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