Oscar 2020: Mais uma edição para "chamar atenção"

Se bem lembram do ano passado, houve um reboliço danado nas redes, pois o melhor filme considerado pelo Oscar 2019,  não era "bom" para os críticos
Era um longa legal, bem feito, com excelentes interpretações. Mas como havia ficado envolto de uns disse-me-disse na mídia especializada, todo mundo desceu a lenha na "escolha". 
Green Book era tão circunstancial quanto Roma. Porém o segundo era da Netflix, dirigido por um diretor latino que já havia ganhado o Oscar em outra edição, mas com um detalhe: com um filme falado em inglês. Dessa vez, com atores desconhecidos e um aspecto de latino mesmo, jeito cru de fazer filmes, levou a estatueta de Melhor Filme de Idioma não inglês mas não de Melhor Filme. Isso gerou uma raivinha nos cinéfilos que eu, particularmente, achei engraçado.
Logo lançaram: a academia detesta a Netflix. Talvez seja verdade. Vide O Irlandês, que foi sumariamente esnobado, apesar de ter grandes nomes no elenco e Martin Scorsese . As animações da produtora, também não tiveram sorte. Quem levou foi Toy Story 4, da Pixar, da Disney.

E dizia-se também - quem quisesse colocar panos quentes - que a academia não premiaria o mesmo filme para as duas categorias, em tese, "divergentes entre si".
Ora. 2020 veio com toda aquela "lacração incômoda" sim e dessa vez, você não verá críticas como do ano passado.
Já à algum tempo a academia está brincando de Sergio Malandro; fazendo "iéiéié" com a cara de muitos, mas poucos percebem. Não se premia o melhor, o mais comentado ou o que recebeu outros prêmios. Premia aquilo que, salta como surpresa - mas nem tanto. Ou por provocação, ou por lobby. Havia uma torcida enorme para Parasita - um filme sul coreano. Já deram de latinos. A hora seria dos asiáticos.

BINGO!


O diretor, em outras premiações, subia aos palcos com uma intérprete. No Globo de Ouro, cutucou a galera presente: indicou que era bom aprenderem a assistir filmes legendados. 
Ele só se esqueceu de dizer que ele mesmo, já fez filmes com atores conhecidos, falando em inglês, para chegar lá e estar nos holofotes. A desculpa? Possivelmente a torcida foi naquela vibe viral que um disse que era bom, o resto, concordou. Vivemos tempos que, opinião individualizada é nociva a ponto de gerar surdez coletiva. Dos torcedores, ninguém assistiu Expresso do Amanhã, por exemplo. 
Mas fiquem tranquilos, a partir de hoje, vai ter muita matéria atualizando a turminha nos portais especializados. Descobrirão um novo gênio que usou dos caminhos fáceis para estar lá no alto do palco, empunhando um prêmio dourado e dizendo algo em sua língua nativa. Os fins justificam os meios.

É claro que eu não gostei da escolha. É um filme melhor que Adoráveis Mulheres? Com certeza. A indicação do filme foi só para agradar a turma da lacração. Mal dirigido e com interpretações esquisitas, as quatro mulheres do elenco principal não eram, nem de longe "adoráveis" como o título em português sugere. Em inglês, Little Woman é adequado: "little" de "pequenês" de espírito. 
Mas no começo do evento, Chris Rock e Steve Martin deram voz ao "lacration" modo "USA": - "Senti falta de algo na direção...", disse Martin, no que Rock rebateu: "Vaginas?"
Sim, as possuidoras desse órgão estarão imunes de críticas. Inclusive, os comediantes foram treinados a falarem isso, e em seguida os câmeras focaram Greta Gerwig.

Ao lado, o marido da diretora, parecia um cordeirinho. Diretor de História de Um Casamento, quando entrevistado no Tapete Vermelho ao lado da esposa pelo canal E!, sequer fizeram uma pergunta sobre seu filme. Ele fez um filme em que coloca os homens (na pele de Adam Driver) como as causas da destruição da vida de uma mulher - que triunfa, separando-se dele e tendo uma carreira, um amor fiel e um filho dedicado. 
A mesma atriz deste, Scarlet Johansson é também a mãe em Jojo Rabbit, um excelente filme que foi problematizado agora porque envolve nazismo e crianças ao mesmo tempo. Na mão de um diretor "top" (odeio o termo, mas é comumente usado...) teria sido dado como inovador e excelente, mas Taika Waititti não chegou nesse patamar. Não é europeu, mas ainda é homem. 

Dos nove filmes indicados, nove possuem personagens mulheres, um deles, dirigido (ainda que muito mal) por uma. Até Ford vs Ferrari e 1917. O primeiro, deu um destaque bom à esposa de Ken Miles (Christian Bale). O segundo, tem um trecho, ainda que muito pequeno, em que Will Schofield - interpretado por George MacKay - encontra uma moça francesa com uma criança. A personagem proporciona uma rápida calmaria ao soldado ferido e em tensão constante.
Não dá mais para falar que as mulheres não tem espaço em Hollywood. Estão em qualquer filme. São protagonistas quando deveriam ser coadjuvantes. Marcam presença, mesmo sem profundidade ou utilidade na narrativa. É o caso de Era Uma Vez... em Hollywood. A personagem de Margot Robbie não tem função na historieta do Tarantino.
E por falar nele, Quentin Tarantino poderia ter dado de Spike Lee esse ano - mas nem deveria, dado que concorreu com o pior filme de sua carreira, mas que deu dois Oscars: Melhor Design de Produção e (quem diria!!) Melhor Ator Coadjuvante para Brad Pitt. 
É...!

Sejamos diretos? Talvez Parasita não seja nem melhor filme estrangeiro. Não assisti Corpus Christi nem Les Miserábles. Podem ser bem melhores. Mas tenho certeza, que não, não é mais interessante (mas diferente) que Honeyland.
Honeyland é documentário em formato de filme, em formato de documentário. Concorria às duas categorias. É um filme também de crítica social tanto quando o Parasita, mais dramático e tocante. Mostra uma criadora de abelhas e seu trabalho informal na Macedônia. Muito pobre, sem água encanada ou eletricidade, ela vive com mãe, muito doente, num casebre entre as montanhas. Novos vizinhos, ciganos, chegam e transtornam a vida da mulher - para pior. 
Não há atores, são pessoas reais. Não há interferências na história por parte de diretor. Ele os filmou e depois editou.  
Mas ó: Parasita é super crítica social... (Ai, ai.)

Por falar em Honeyland, abrimos brecha para dar risada sobre a escolha de melhor documentário. Não venceu o representante macedônio, mas sim Indústria Americana. Muito elogiado pelos entendedores de plantão, certamente tem recortes dúbios como qualquer documentário, mas não é, nem de longe, uma propaganda política ridiculamente falsa como Democracia em Vertigem.
O pessoal ali ficou desconfortável com os "protestos"? Sim, porque ali, querem igualdade, lutam pelas minorias, mas só quando convém. No todo, não duvidaria se dissessem também que o "desconforto" tinha sido "programado".
Assistam o trailer de For Sama e me digam de novo, que "o representante do Brasil" é para ter orgulho e não pode ser criticado.
Se era para ter um representante plausível que fosse Dois Papas - um excelente trabalho encabeçado pelo Fernando Meirelles, esnobadíssimo pela academia para o quê? Um asiático (que também se mostrou soberbo.

Ao contrário do ano passado, em que Spike Lee falou poucas e boas sobre o Green Book, não vimos um nada sobre os diretores em relação ao Parasita. Talvez porque não tenha os problemas que acusaram o Green Book de ter (embora, foram argumentos que para mim, nem eram assim tão graves, era puro choro). 
As críticas podem não ter vindo mesmo por medo de criticarem um filme de não brancos e de idioma não inglês. 
O filme é bom, mas eu não gostei do final, o que - no linguajar atual - passa a não ser "essa coca-cola toda". Você se perde em vários momentos, pois você não sabe se assiste à uma comédia, um drama, um suspense ou um thriller. Isso deveria ser um critério de tecnicidade levada à sério para Oscar. Mas estão lá, com a estatueta. 
Sigo achando que o melhor filme é 1917, que ganhou apenas melhor efeitos visuais, melhor mixagem de som e melhor fotografia. Apaixonei pelo filme e essa é a beleza do cinema, atual, com todo esse discursos e todos esses streamings e redes sociais te dizendo o que é ou não bom. A beleza ainda é não se importar com o que diz a crítica, com as problematizações ou as dores de cotovelo feitas em torno do longa. Estarei no aguardo do lançamento em DVD. É algo para ter em casa e assistir sempre que estiver com vontade. 

Sobre evento, os destaques devem ser muitos: Janelle Monae abriu o evento com músicas dos filmes Um Lindo Dia Na VizinhançaNós e Coringa. Cantou bem, e agitou os atores da primeira fila - alguns ficaram empolgados, outros muito sem graça (inclusive Leonardo DiCaprio, visivelmente já arrependido de ter ido). Com cara de Grammy, a coisa ainda poderia ir mais ainda para esse lado. E foi. Eminen apareceu de surpresa cantando Lose Yourself - música que venceu em 2003 como melhor canção original. A vencedora do Grammy desse ano, a tal Billie Eilish (que já havia aparecido/causado demais no tapete vermelho) cantou Yesterday dos Beatles no In Memorian. Não estragou, mas somos fã do original.

Como já prevíamos, Melhor Canção ficou para (I'm Gonna) Love Me Again do filme biográfico do Elton John, Rocketman. Falaremos disso, noutra postagem para que essa não fique extensa demais. Trago amanhã os vídeos de todas as canções e é claro, da merecida vencedora.
Para trilha sonora deu Hildur Guđnadóttir, do Coringa. Muito merecido, também! Falamos aqui, sobre o Bafta, na semana passada, e podem conferir o que escrevi sobre a compositora. 

O Oscar 2020 chamou a atenção, como tem sido nas últimas edições, mas não para o necessário, o apreciável. Há muito discurso, muita gente falando o que quer sem se preocupar com os limites do bom senso ou mesmo, sem se preocupar se vai ofender alguém indiretamente. Os excessos do pessoal querendo aparecer com a sua causa e/ou com a sua aparência veio para ficar. Chega a ser brega. 
Por trás, onde vale a pena ter destaque, holofote ao que merece, fica a cada ano, mais a desejar. Tudo é envolto de muito negócio. Isso, diz muito mais sobre o evento e sobre a indústria, do que sobre a arte que cada vez menos aqueles colocam esforço e trabalho, são os considerados. 
A previsibilidade é uma situação chata, mas no caso ela seria bem-vinda, isso se tivesse espaço para ela. Por isso, fecho o texto dizendo: eu preferi o Bafta. #fazeroquê?

Abraços afáveis!

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