Crowley: O bruxo “influencer” de rockeiros (4)


Dos anos 1960 coletamos e contamos as voltas de Jimmy Page e o Led Zeppelin e John Lennon e os Beatles, com essas histórias místicas. Os músicos em questão contam com capítulos relacionados sobre terem "vendido" as suas almas ao Chifrudo em troca de sucesso musical, dentre outras coisas.
Mas e os Rolling Stones? Eles tiveram uma parcela dessa influência com Aleister Crowley? Pois a boca pequena diz que sim, é claro!
Se pensaram no álbum Their Satanic Majesties Request (1967) ou em Sympathy for the Devil vocês não estão muito longe do conteúdo da postagem de hoje.


 Envoltos de uma aparência de bad boys, só faltavam serem também "satanistas". Com o disco na qual vemos a capa (acima) e o encarte do vinil, conseguimos entender o recado. Acompanhando a vibe psicodélica da época, o disco foi recepcionado com polêmica já pelo título. De cara, a estranheza se fazia proposital: os músicos estavam vestidos com roupas muito coloridas e chapéus pontudos, como bruxos. No interior, várias imagens salpicadas arregalam o clima psicodélico proposta pela gravadora para acompanhar o movimento exaltado a partir do Stg Peppers.

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No que diz respeito a sonoridade, o disco é bom e tem boas músicas boas como We Love You e 2000 Light Years From Home, mas é considerado por alguns um álbum "estranho", "barulhento" e para outros, "bagunçado". O externo das sessões de gravação podem ter contribuído para que o disco soasse sem rumo ou confuso: os músicos enfrentavam problemas particulares na época, desde processos, até consumos excessivos de drogas que levavam Keith Richards, por exemplo, ir e vir das clínicas de reabilitação.

O disco seguinte, ia agitar a comunidade conservadora de forma muito mais enfática, logo na faixa de abertura: Sympathy for the Devil, cuja a letra é uma narração em primeira pessoa do Diabo chegou para abalar. Sim, ele deu uma "descida" no Mick Jagger e estaria lembrando momentos fatídicos da humanidade, que, no caso, foram todos inspirados por ele mesmo.
Sympathy for the Devil é uma das (melhores) faixas do disco Beggars Banquet (1968) e foi escrita pelo próprio Jagger sob uma suposta inspiração de um livro do escritor russo Mikhail Bulgakov, intitulado O Mestre e a Margarida. O romance possui tramas centradas numa visita do Diabo à Moscou no início da década de 1920, na era stalinista.
A partir disso, Jagger usou a primeira pessoa para mencionar trechos da história mundial e isso deu um ar interessante à letra, com trechos históricos e até poéticos. Em relação à inspiração da literatura, citamos o parágrafo:

I stuck around St. Petersburg
When I saw it was a time for a change
Killed the czar and his ministers
Anastasia screamed in vain
("Eu fiquei por São Petersburgo / Quando vi que era a hora de uma mudança / Matei o czar e seu ministros / Anastásia gritou em vão")

A princípio, a referência à Kennedy estava no singular, em referência ao assassinato do 35º presidente dos Estados Unidos, John Kennedy. Mas enquanto estavam no estúdio, ficaram sabendo do assassinato de seu irmão dele, Bob Kennedy (que ocorrera em junho de 1968). De acordo com a melhor fonte que pude encontrar (sim, o Ron Groo, rsrsrs...), Charlie Watts teria comentado: “troca a letra e grava logo antes que matem mais algum deles e você não consiga enumerar”. E assim ficou:

I shouted out
Who killed the Kennedys?
When after all
It was you and me
("Gritei alto / Quem matou os Kennedys? / Quando, no final das contas / Fui eu e você")

Como disse, a letra é interessante e sob o ponto de vista histórico, remonta aspectos intrigantes da humanidade. E ter a ótica do Anjo Caído como "causa" de alguns destes momentos decadentes da história, é algo que eleva ainda mais o padrão da música.

Sob o aspecto sonoro, algumas coisas podem ser destacadas: houve uma intenção meio folk para a canção, muito provavelmente por influência de Bob Dylan. Conta-se que este (não se sabe se é verdade) ao ouvir a música, não teria gostado do resultado.

Além disso, Sympathy for the Devil foi composta pouco depois que os Rolling Stones estiveram no Brasil, e estiveram na Bahia. Mick e Richards visitaram um centro de candomblé e ficaram fascinados com pontos de macumba. Isso explica o ritmo da percussão na música, inclusive tendo chamado um percussionista brasileiro para fazê-la. A ideia de que ela soasse assim parece ter partido de Keith, dando uma atmosfera meio xamânica, por assim dizer. 
O resultado é primoroso, como podemos conferir na apresentação do Rock and Roll Circus:


É bem óbvio que a música motivou as acusações sobre satanismo encabeçadas pela comunidade conservadora sessentista. Grupos religiosos levaram isso tudo muito a sério. Assim, para eles era certeza que eles fossem – já marcados como desajustados ou até transgressores – adoradores do Demônio. Os caras brincaram com isso de forma jocosa, até o incidente do show em Altamont.

O show era o último da turnê dos Rolling Stones que já era considerada uma das maiores banda de rock do mundo e o festival ocorreu em dezembro de 1969.
Imaginem se a coisa já dava indícios de que não daria m...? O festival era gratuito, nenhuma autoridade policial estaria envolvida e tinha uma áurea de Woodstock. Obviamente começou a rolar a distribuição de drogas como LSD e anfetaminas entre os estudantes e para piorar a "segurança" era garantida pelo clube de motociclistas, Hell’s Angels. Os caras, depois de beberem e usarem drogas, ficaram alterados, começaram a bater em todo mundo.

No show dos Rolling Stones a confusão chegou ao ápice! Conta-se que, enquanto a banda tocava Sympathy for the Devil houve uma confusão dos diabos (desculpem o trocadilho...) bem em frente o palco. Na verdade, a banda tocava Under My Thumb do álbum de 1966 Aftermath, e um dos membros do Hell’s Angel perseguiu um garoto negro de 17 anos, esfaqueou-o e pisoteou-o na frente do palco, sem que Jagger, por exemplo, entendesse o que estava acontecendo. Sem deixar que ele recebesse socorro, o rapaz acabou morrendo ali mesmo.

Depois de Altamont, os Rolling Stones só voltariam aos Estados Unidos após três anos e Mick acabou colocando a culpa na música Sympathy for the Devil pelo incidente alegando que "coisas estranhas acontecem quando eles tocam a música do diabo".

Mais de 30 anos depois da gravação dessa canção icônica, outra banda famosa (só que norte-americana), decidiu regravar Sympathy for the Devil. O Guns N’ Roses colocou a versão deles como a última faixa de uma coletânea, mas não sem antes ter alcançado notoriedade aparecendo na trilha sonora de um filme lançado em 1994, o Entrevista com o Vampiro – adaptado do romance de horror homônimo de Anne Rice.

O livro e o filme inicia-se com um jovem repórter entrevistando Louis, e este conta sobre sua vida antes de se tornar vampiro, como se transformou, como conheceu Lestat, como tornou vampira a órfã Cláudia e também a breve relação que teve com Armand. A história dele começa em New Orleans e segue-se em suas viagens pelo mundo, buscando explicações, enquadrando a passagem do tempo e refletindo sobre os aspectos da imortalidade.

O filme foi um sucesso, mesmo com as reprovações de Rice em relação à escolha do elenco. Ela teria sido totalmente contra a contratação de Tom Cruise para ser o cínico vampiro Lestat, aparentemente por acreditar que, por ser um galã, Cruise não era o ator ideial para encarnar o personagem. Anne deve ter pagado língua, pois, Tom entregou um Lestat irretocável.
Completa o elenco Brad Pitt (como Louis), Kristen Dunst (como Cláudia), Antonio Banderas (como o sedutor vampiro, Armand) e o papel de repórter acabou ficando para Christian Slater. Inicialmente, o também galã da época, River Phoenix faria o papel do entrevistador Daniel Malloy, mas em 1993 River faleceu em decorrência de uma overdose de heroína e cocaína.

O romance é de um gênero (se é que podemos chamar assim) que até pouco tempo nem sabia que existia: "horror queer". Que diabos (de novo, não resisti...) é isso? Bom, resumindo, parece ser um  de narrativa encontradas em obras de literatura ou filmes em que, no gênero terror, um dos personagens é gay, há uma tensão relacionada com a homossexualidade, ou é de particular interesse para o grupo de gays e lésbicas por algum motivo específico. 
Entrevista com o Vampiro faz parte do imaginário contemporâneo que gira em torno da figura do vampiro como um imortal misterioso e altamente sedutor. O filme, por ter também um grande número de atores considerados muito bonitos, desempenhando papéis sedutores que não distinguirem preferências sexuais por homens ou mulheres, mostraria isso com mais clareza.

A figura dos chupadores de sangue alheio, desde as primeiras aparições na literatura, sempre tiveram o imaginário folclórico ligado ao governante do Inferno como verdadeiros anticristos, afinal são amaldiçoados pela prática sangue-suga com a imortalidade e a vida em completa trevas.
Entidades vampíricas foram registradas nas culturas e remontam até períodos pré históricos e não são seriam novidade folclórica de John Polidori ou até mesmo, Bram Stocker. 

Surpertição é claro. No século XIX, o Drácula estabeleceu o arquétipo do vampiro sofisticado e sedutor que só poderiam ser mortos se seus corpos fossem perfurados com estacas e coisas do tipo.  Surpertição é claro, que vinha correndo a Europa inteira, há séculos. Vampiros são seres criados na imaginação e existem penas nesse âmbito. Se escapam daí é como proposta de fantasia das relações ou autopromoção de gente excêntrica. 
E na década de 1960/70 esses assuntos sobre misticismo e ocultismo estavam muito próximos aos personagens reais da cena rock – muitas vezes sem comprovação alguma que acreditassem de fato em qualquer coisa relacionada à essas temáticas. Eles também, de uma forma ou de outra, eram caracteres altamente sedutores, se não em termos sexuais, pelo menos, em  termos de curiosidade. 
O líder dos Rollings Stones se encaixaria nesse aspecto, afinal era considerado um sex symbol e sempre pareceu, digamos, insaciável. Teve muitas namoradas, amantes e casos. No ano passado, ele foi pai pela oitava vez, e tem nada mais do que 73 aninhos e contando... 

Carregados desse misticismo todo, o assunto não poderia ser outro com os membros do Rolling Stones: Jagger e Keith Richards flertaram com o ocultismo, sendo que Mick teria uma sólida amizade com Kenneth Anger – discípulo direto de quem? Aleister Crowley, é claro! Keith teria até cogitado em se casar com Anita Pallenberg numa cerimônia pagã ministrada pelo excêntrico Kenneth.

Kenneth Anger considerou os Rolling Stones dotados de uma força tamanha, capaz de abalar os alicerces sociais, como se Mick Jagger e Keith Richards fossem paralelos modernos de Lúcifer e Belzebu, respectivamente, numa visão religiosa do romantismo. 

Doido de pedra? Sim ou com certeza?


Anger é mais conhecido no cinema independente. Seus filmes que, além de serem altamente experimentais, misturam surrealismo como homoerotismo, além é claro, do "famigerado" ocultismo.  Apesar de ser homossexual assumido, não há muito sobre sua vida particular circulando na web, mas para quem quiser ler alguma coisa sobre, pode fazer como eu e dar uma olhadela nessa reportagem aqui

 Para o próximo papo, iremos avançar mais no assunto e chegando ao "nosso" Príncipe das Trevas...

Abraços mega afáveis!

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