Tempo de ser livre – O primeiro voo solo de André Matos, por Marcos Antônio

Em 8 de junho de 2019, um infarto ceifou a vida de um dos maiores cantores de heavy Metal que o Brasil teve aos 47 anos.
Vocalista de uma das minhas portas de entrada ao metal, fica aqui minha homenagem a André Matos.

Após um longo de período de mais de 20 anos sendo parte de bandas como Viper, Angra e Shaman, e participar de inúmeros projetos, a mente inquieta do André Matos se voltou para criar sua carreira solo. Em 2007 ele lançaria seu primeiro álbum: Time To Be Free, um título com significado, como se fosse a hora de se soltar das amarras e seguir o seu próprio norte musical.
Para isso ele reuniu os irmãos Mariutti (Luís baixista e Hugo guitarrista), André ‘Zaza’ Hernandes (guitarrista que fez parte dos primórdios do Angra) Rafael Rosa na bateria e Fábio Ribeiro no teclado.
Quem ficou esperando uma quebra total dos rumos musicais de André por conta do título do seu álbum, pode ter ficado frustrado.
Onde ele ousou e muito bem foi no projeto Virgo que fez ao lado de Sasha Perth e resultou em um álbum supreendentemente bom, já que a pegada dele foi mais pop do que qualquer outro trabalho feito pelo vocalista.

Esse álbum acabou sendo um encontro do seu trabalho no power metal com as influências do hard rock e heavy metal em que ele sempre quis colocar em alguns dos seus trabalhos anteriores, mas não conseguia.
Após a primeira música ‘Menuett’ uma pequena ponte para mostrar a influência clássica de André, alguns dos versos da segunda música ‘Letting go’ Across the centuries of pain/My heart is rising again/Did you hear all my cries? Podem soar como indireta a alguém, mas era apenas uma canção de passagem, de deixar o passado para trás e seguir em frente, como em muitas letras nesse álbum. Musicalmente, a canção agrupa toda a influência das bandas em que André faz parte na carreira.
Já músicas como ‘Rio’, ‘How Long’ e ‘Rescue’ (as duas últimas principalmente) trazem uma pegada muito mais heavy metal tradicional do que o power metal que consagrou o cantor, que que foi menos melódico e cantou de forma mais rasgada do que o comum. ‘How Long’ pra mim é uma das melhores do álbum, onde André Matos finalmente mostrou suas grandes influências, o Iron Maiden e o Judas Priest.  Já ‘Rio’ decepciona por ter poucas de ritmos brasileiros- afinal é sobre a cidade carioca, talvez por medo da canção ser comparada à alguma do álbum ‘Holy Land’ do Angra, onde esse recurso foi amplamente usado (e com sucesso). ‘Rescue’ além do elementos heavy metal, trazem batidas tribais e uma flauta acompanhando os solos de guitarra, uma sutil referência a Jethro Tull.
‘Remember Why’ e ‘Looking Back’ são as músicas mais próximas de baladas que temos no disco, com destaque para segunda que faz um bom ambiente com os violões mais pop, alternando o com metal já conhecido da carreira de André. Já Remember Why é mais experimental, emulando sons de gaita de fole feitos por um tremelin. Mas a canção acaba lembrando um pouco do Víper, banda seminal do power metal brasileiro que André fez parte. E não foi à toa, pois o baixista da banda Pit Passarell é co-autor da canção.
Em ‘Face to the End’ o destaque é o teclado de Fábio Ribeiro que traz o clima soturno necessário para acompanhar a voz de André Matos, uma das músicas que mais fogem do power metal do álbum. Já a música-titulo do álbum, ‘Time to be free’, é um épico que vai crescendo conforme a música vai crescendo, em uma canção que se fosse sobra de algum álbum do Angra eu não me surpreenderia. (Achei o release de imprensa do disco e não é que é citado no momento de falar da música ‘para lembrar os tempos de Angra.’?)

‘A new Moonlight’ é uma releitura de uma canção do Viper ‘moonlight’, onde ao reimaginar a canção, André ousa e faz algo totalmente diferente sem (tantos) agudos potentes e guitarras poderosas, e joga outra de suas influências na música: Queen. Ouça a música e presta atenção no piano e nos ‘backing vocals’ para entender melhor essa referência.
‘Endeavour’ encerra o disco com o power metal raiz, como gostam de dizer hoje em dia, solos de guitarra, vocais potentes, velocidade e força, e apear de empolgar em alguns momentos, acaba soando meio padrão acaba sendo um fim sem tanto destaque.
Ao menos para a versão japonesa o álbum terminou melhor, com o cover de ‘Separate Ways (Worlds apart)’, clássico da banda de Classic Rock/AOR Journey. André fez esse cover por conta de muitas comparações que fizeram do alcance vocal dele com o de Steve Perry, vocalista clássico do Journey. A versão mais pesada da música soa bem e é uma das mais divertidas do álbum, pena que só o Japão a teve oficialmente no álbum – onde André Matos vendia muito.
‘Time to be free’ acaba não tendo o aspecto de ser um álbum libertador e inovador. Mas ele não um álbum ruim. Ele encaixou o máximo de referências possíveis de outras vertentes do rock e heavy metal no power metal e fez um álbum honesto e de qualidade, o melhor de sua carreira solo – o álbum seguinte ‘mentalize’(2009), que traz o fenômeno da bateria Eloy Casagrande é subestimado, mas não chega a ser melhor  e ‘the turn of the lights’(2013) é o álbum mais genérico e sem inspiração da carreira dele.
Com certeza, ‘Time to be free’ é o álbum ideal para se conhecer André Matos em sua essência criativa e técnica, seus gostos, influências e ótimas letras. Ouça de coração e ouvidos abertos.

Marcos Antônio é editor do Surto Olímpico 
e headbanger nas poucas horas vagas

Comentários