30 anos de Automatic For The People, uma das obras primas do REM

Recentemente em cinco de outubro, o clássico álbum do REM, Automatic For The People completou 30 anos de seu lançamento.
Há poucos discos dos quais se pode dizer que envelheceram tão bem quanto este.
É o sucessor de um dos mais importantes e bem sucedidos discos dos anos noventa, Out of Time (1991) em que o REM adicionou ao seu som seções de cordas, bandolins e intervenções de teclados ganhando definitivamente o planeta com as faixas “Losing My Religion” e a chiclete (que a própria banda dizia não gostar) “Shine Happy People”.
O passo seguinte era esperado pela gravadora como uma continuação deste trabalho, mas Bill Berry, Mike Mills, Peter Buck e Michael Stipe tinham outros planos e quando se reuniram viram que as novas ideias tinham potencial para um disco ainda mais acústico, mais depurado e assim foram nascendo canções como “Drive”, “The Sidewinder Sleeps Tonite”, a maravilhosa “Nightswiming”, a arrasa quarteirão triste “Everybody Hurts” e “Man on the Moon”, canção homenagem ao humorista Andy Kauffman. Além claro, de todas as outras pérolas que o disco traz.
Não há guitarras incisivas e nem baterias pesadas.
As únicas duas em que não há instrumentos acústicos (“Monty Got a Raw Deal” e “Ignoreland”) estão no lado B, embora não possam ser chamadas exatamente de “lados B”.
Michael diz ter escrito alí algumas de suas letras mais emocionais combinando temas como perda, mortalidade e um adeus à terrível era Reagan-Bush.
O nome do disco remete à uma rede de lojas da cidade de Athens que usava a expressão como slogan e era especializada em “soul food”, seja lá o que isso for.


Algumas curiosidades sobre as faixas.
Segundo Scott Litt, o produtor do disco, o arranjo de “Drive” foi inspirado no Queen: “-Pete e Mike são grandes fãs do Queen. Os discos do Queen, apesar de todo o seu lado bombástico, soavam como se cada músico tivesse uma personalidade”. – diz.
Acústica e delicada, a canção ganhou uma versão pesada na turnê de Monster (1994) álbum que sucedeu Automatic, que não teve uma turnê de divulgação.
“Try Not To Breath” é uma canção sobre morte, mas a escolha do título é no mínimo curiosa, para não dizer engraçada.
Durante a gravação das demos, o guitarrista Peter Buck estava com o microfone de seu violão posicionado perto da boca e o engenheiro de som reclamou de que estava fazendo muito barulho.
O guitarrista então respondeu: “-Ok, vou tentar não respirar.”.
Obviamente, a ideia do cara era dizer que não respiraria enquanto o engenheiro estivesse ajustando o som, mas Michel Stipe ouviu e disse que era um título muito bom.
Com arranjo de cordas feito por John Paul Jones, “The Sidewinder Sleeps Tonite” é a canção mais alegre do disco.
Foi uma concessão da banda ao clima sombrio que se instalava a cada canção que era finalizada.
A canção sobre memórias felizes da juventude faz o guitarrista Peter Buck lembrar que nem tinha casa naquela altura, dormindo em hotéis por dezenove dólares por noite, como disse no documentário REM da MTV.
Com sua mensagem anti suicídio, “Everybody Hurts” é a música mais emocional da banda até então.
Formatada como uma balada soul, mais precisamente soul da Stax Records, tem uma mensagem muito clara: “you´re not alone”.
Mas é dolorida de tão triste.
A instrumental “New Orleans Instrumental No 1” foi escrita e gravada ao vivo no durante uma das madrugadas de trabalho no estúdio de Daniel Lannois que disse à Peter Buck: “-Por que você não escreve alguma coisa aqui?” e o guitarrista então pegou – segundo ele – algumas garrafas de vinho e se sentou em um canto com a guitarra.
O resultado é um tanto sombrio, mas muito belo.
Apesar de ser considera a música que sintetiza o disco tanto na parte lírica quanto sonora, há apenas um integrante da banda tocando instrumento em "Sweetness Follows". O restante são nuances de violoncelo passando pelos amplificadores.
A faixa foi finalizada pelo produtor Scott Litt sozinho em um estúdio em NY.


A letra de “Monty Got a Raw Deal” foi escrita no estúdio depois do instrumental já estar finalizado.
Stipe fala sobre astro do cinema Montgomery Clift, mas inspirado em uma fala de outro astro do cinema, John Wayne no filme O Homem Que Atirou em Liberty Valance: “Quando a lenda se tornar fato, imprima a lenda”.
Michael tece a letra sobre os boatos de que Clift e Elizabeth Taylor tinham um caso fora dos sets de filmagem, quando, na verdade Monty escondia – como muitos outros – sua real condição de homossexual.
“Ignoreland” é sobre os EUA, como aponta Mike Mills:  “-São pessoas que só obtêm suas informações de trechos de som e televisão, e que realmente não se preocupam em pesquisar os candidatos presidenciais – ou, em última análise, os mais importantes, que são seus candidatos locais.”.
Exatamente como um certo país da América do Sul, só que com redes sociais e aplicativos de troca de mensagens.
O título original de “Star Me Kitten” era algo como “Fuck me Kitten”, o que provavelmente renderia ao disco uma etiqueta de “Parental Advisory”, o que levou a atriz Meg Ryan a dizer para Peter Buck que, apesar de ter adorado a canção, não poderia comprar o disco em sua terra natal por conta do adesivo.
Pensando nisso, e nos Rolling Stones, a música que é sobre luxuria foi rebatizada com seu título definitivo.
“Star”, é uma referencia ao clássico stoneano “Star Star” do disco Goat Head Soup (1973), que tem o refrão: “star fucker, star fucker, star fucker, star”.
O country rock “Man on The Moon” ficou pronta antes de ter um título ou mesmo uma letra.
Michael Stipe passou por um bloqueio criativo antes do fim das gravações do disco e isso atrasou um pouco sua finalização.
O tal bloqueio só foi vencido após o vocalista começar a caminhar pelas ruas de Seattle pensando em como os fãs de Kaufman passaram tanto tempo não acreditando na notícia de sua morte, resultado de um câncer, em 1984. A teoria era de que, assim como acreditavam os fãs de Elvis Presley, ele tivesse fingido sua morte para escapar às pressões da fama.
Isso fica sintetizado no cético refrão: “Se você acredita que eles colocaram um homem na lua / Se você acredita que não há nada na manga, então nada é legal”.
Provavelmente a música mais agridoce da história, “Nightswimming” teve sua seção de piano gravada no mesmo instrumento em que Derek and the Dominoes fizeram a icônica coda da faixa “Layla”.
A canção é anterior ao processo de confecção do disco, datando das sessões para a gravação de Out of Time.
“O tempo não para. O oceano é o objetivo do rio. A única coisa que é verdadeiramente automática para as pessoas é que cada um de nós tem uma data final”. É sobre isso a faixa que finaliza o disco.
Mas só porque “Find the River” lida com a morte não significa que seja deprimente, é uma das musicas mais bonitas do disco dando uma humanizada em um tema tão pesado.
O disco foi considerado o álbum do ano pela NME e entrou na lista de 200 álbuns definitivos do Rock and Roll Hall of Fame vendendo dezoito milhões de cópias mundialmente.

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